Conto: Pés e percalços
- 10 de set. de 2020
- 2 min de leitura
Atualizado: 27 de mai. de 2021
Os pés doíam, caminhar três quilómetros usando um chinelo de dedos não era uma tarefa fácil, mas ela só percebeu na metade do caminho e voltar não era uma opção. Enrugou o nariz ao pensar que o ralado no meio dos dedos aumentaria. Retornar descalça seria ainda pior.
O sol ainda estava fraco, mas tinha passado protetor solar já prevendo o retorno. Enrugou um tanto mais o nariz, a mistura de protetor solar e suor não seria algo agradável.
Caminhou em direção às ondas, a maré baixa a obrigou a avançar mais que o normal pela areia úmida e parou. Imaginar o sal, a areia sobre a pele, o ralado no pé fez com que ela retornasse, lamentando. Sem contar o ardor que sentiria na parte machucada. Talvez aquela não tivesse sido uma boa ideia, afinal. Ato de rebeldia levantar antes de todos e sair... Até nisso estava equivocada.
Cabisbaixa, voltou a caminhar, agora paralela ao mar. Os cabelos esvoaçantes, a saída de praia amarrada na cintura sendo levada vez ou outra para o alto e ela tentou segurar a barra para que não mostrasse demais, andar de forma confortável sem curvar-se demais era quase impossível. Pior ainda, com a bunda para o alto. Mais uma escolha para ser repensada.
Não queria mostrar demais, ser motivo de chacota, não queria vestir aquela pele, não queria que vissem as pernas roliças e as marcas que nunca a abandonavam. Não queria...
Ouviu um assovio, olhou para trás e o sorriso foi imenso, capaz fazê-la esquecer a espessura das coxas, os quilos que nunca iam embora, a vontade de ser outro alguém.
Foi abraçada com carinho e levantada do chão por breves instantes. O cheiro de peixe competindo com o perfume barato comprado em uma farmácia qualquer e mesmo assim ela respirou um pouco mais forte. O beijo foi lento, suave, uma verdadeira carícia entre lábios que não conseguiam se distanciar. Talvez, aquela tenha sido a única decisão acertada do dia.







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